segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Clínicas: afinal quem fiscaliza o quê?

A Inspecção Geral de Saúde instaurou um inquérito ao caso da clínica de Lagoa, mas admite que só actua por denúncia. Clínica estava ilegal há sete anos, mas ARS também ainda não dispõe de meios para a fiscalização.

Fosse a clínica I-Qmed, de Lagoa, uma verdadeira clínica e não um consultório, conforme o Observatório do Algarve já noticiou, e existiriam três entidades com a mesma competência para fiscalizar a sua actividade, a Administração Regional de Saúde, a Entidade Reguladora da Saúde e ainda a Inspecção Geral das Actividades de Saúde.
Mas os organismos não se entendem quanto a quem deve fiscalizar o quê. Contactado pelo OdA, Rui Lourenço, o presidente da ARS-Algarve garantiu que é à IGAS, a Inspecção Geral das Actividades de Saúde, que cabe a fiscalização. “É a IGAS, sedeada em Lisboa que fiscaliza. Passou a ter essas competências”. Mas fonte da direcção da IGAS garante exactamente o oposto. “Não senhor, vá ver o decreto lei 279/2009, está lá tudo", diz.
Segundo o decreto, em vigor há um ano, ficou estabelecido uma espécie de ‘simplex’ do licenciamento, isto porque as unidades de saúde passaram a poder gozar de um regime simplificado. Agora, basta às clínicas preencher uma declaração electrónica na qual se responsabilizam pelo cumprimento dos requisitos de funcionamento exigíveis para a actividade a que se propõem.
Por um lado, o Governo entende que “A existência de um procedimento simplificado não significa que haja uma facilitação no cumprimento dos requisitos técnicos, ou que a Administração seja menos rigorosa na exigência de qualidade”.
Mas, pelo menos para já, a verificação dos pressupostos torna-se complexa. “Nós agimos por denúncias”, admite fonte da IGAS, apressendo-se posteriormente a enunciar uma série de acções inspectivas realizadas no ano passado a consultórios dentários, após queixas de profissionais portugueses.
É à ARS-Algarve (e as outras administrações regionais), que de acordo com o artigo 7 do Decreto-lei 279/2009, cabem as competências para decidir o pedido de licença e para vistoriar as unidades privadas de saúde. “Sem prejuízo das competências e poderes regulamentares, de supervisão e sancionatórios da ERS, compete à ARS territorialmente competente, em articulação comas autoridades de saúde de âmbito regional, vistoriar as unidades privadas de serviços de saúde e, em articulação com a Administração Central do Sistema de Saúde, I. P. (ACSS, I. P.), proceder à monitorização e avaliação periódicas da observância dos requisitos de funcionamento e de qualidade dos serviços prestados”, pode ler-se no decreto.
Três em um
Por outro lado, em simultâneo, cabe à Entidade Reguladora da Saúde, segundo o decreto lei 127/2009, “velar pelo cumprimento dos requisitos legais e regulamentares de funcionamento dos estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde e sancionar o seu incumprimento”.
Mas a Inspecção Geral de Saúde também tem poderes na matéria. “Nós estamos acima disso tudo, podemos fiscalizar as próprias ARS, mas também temos competências na fiscalização”, admite a fonte da IGAS. No entanto, quando questionada sobre a responsabilidade de fiscalizar a alegada clínica de Lagoa, a resposta é peremptória: “Isso é da ARS”, garante.
O decreto obriga ainda a que “Sem prejuízo das competências e poderes regulamentares, de supervisão e sancionatórios da ERS, compete à ARS territorialmente competente, em articulação com as autoridades de saúde de âmbito regional, vistoriar as unidades privadas de serviços de saúde e, em articulação com a Administração Central do Sistema de Saúde, I. P. (ACSS, I. P.), proceder à monitorização e avaliação periódicas da observância dos requisitos de funcionamento e de qualidade dos serviços prestados”.
Essa é uma tarefa que poderá até ser realizada por empresas contratadas para o efeito, desde que registadas no Instituto Público chamado Administração Central dos Sistemas de Saúde. (ACSS, I. P.).
O regime estabelece ainda que as ARS devem disponibilizar através dos sítios da internet informação actualizada sobre a firma ou a denominação social e o nome ou insígnia das unidades privadas de serviços de saúde, os respectivos endereços, serviços prestados e datas de abertura.
Diz o Governo que o objectivo da nova legislação é o de garantir "um sector privado de prestação de serviços de saúde, complementar ao Serviço Nacional de Saúde, que garanta qualidade e segurança".
Mas convém lembrar que o novo sistema assenta em muito na auto-responsabilização. Basta dizer que se após uma vistoria, o prazo de decisão de 30 dias que cabe à ARS for ultrapassado, a unidade de saúde fica automaticamente licenciada por “deferimento tácito”.
Dr Rui Lourenço, Presidente da ARS do Algarve
Por questões de ‘afinação’, prevê-se que o decreto -lei deverá ser revisto no prazo de dois anos, isto é, em Julho de 2011, “a fim de garantir que o desiderato que o norteia é efectivamente prosseguido”. 

Com a devida venia a Observatório do Algarve

4 comentários:

Anónimo disse...

Por indy (09-08-2010 11:08:00)
Quando os portugueses descobrirem que ficaram entregues a um cáfila de mercadores da saúde, da doença e da morte, já será tarde. Aqui não se aplica a Lei Extra-Contratual do Estado, logo não há direito a indemnização. As vítimas têm de pagar a advogados e esperarem que a OM condene o que será 1º vez

Anónimo disse...

Clínica de Lagoa atendia pacientes de Vila Real de Santo António e Castro Marim
06-08-2010 16:00:00

A clínica IQ-Med em Lagoa, Algarve, onde quatro pessoas foram submetidas a tratamentos oftalmológicos e estão em risco de cegar, recebia pacientes de Vila Real de Santo António e Castro Marim, confirmaram os autarcas.
O autarca de Vila Real de Santo António, Luís Gomes, confirmou à Lusa que foram transportadas várias pessoas àquela clínica, mas apenas para consultas e nunca para intervenções.

"Temos um programa de oftalmologia e levamos as pessoas a várias clínicas porque não havia capacidade de absorção do Serviço Nacional de Saúde", explicou Luís Gomes.

Face à lista de espera que existia para cirurgias oftalmológica no Algarve, este autarca enviou em 2008 cerca de 200 munícipes para serem operados em Cuba.

Já o presidente do município de Castro Marim, José Estevens, em declarações à antena da TSF, assumiu que se deslocavam doentes àquela clínica, no âmbito do programa da câmara de apoio aos munícipes que necessitavam de intervenções às cataratas.

IQ-Med fez obras há três meses

Os funcionários da empresa contígua à clínica, que se encontra sedeada na zona industrial de Lagoa, José Carlos Reis e Hélder Caçiola, adiantaram ainda que muitos estrangeiros e também pessoas vindas de Lisboa se deslocavam à clínica.

Os dois funcionários de uma empresa localizada a 20 metros da clínica de oftalmologia, disseram que no verão do ano passado viram por várias vezes camionetas da câmara municipal de Vila Real de Santo António que transportavam pacientes para consultas.

"Até temos um colega que fez uma intervenção de oftalmologia aos dois olhos e que ficou bem", recordou José Carlos Reis.

A clinica I-QMed, localizada na zona empresarial de Lagoa, está encerrada com um aviso que indica obras de remodelação. Mas vizinhos, que trabalham junto ao local, adiantaram à Lusa que há pouco mais de três meses a clínica sofreu obras de remodelação para ampliação e reabriu posteriormente.

Os quatros doentes que estão em risco estão com um "prognóstico muito reservado", disse à Lusa fonte do Centro Hospitalar de Lisboa Central (CHLC).

As intervenções oftalmológicas decorreram a 20 de julho na clínica I-QMed de Lagoa, no Algarve. Um dos doentes, uma mulher de 35 anos, foi operada para colocar lentes intra-oculares, e os outros três fizeram operações para tratar cataratas.Um dos doentes é de nacionalidade inglesa.

Dois dias, depois a mulher de 35 anos deu entrada na urgência do Hospital de São José, em Lisboa, com uma infeção grave. Os outros doentes chegaram a São José no dia 26 de julho com os mesmos sintomas.
In: OA

Anónimo disse...

O juiz desembargador Eurico Reis aconselhou hoje os quatro doentes que correm risco de cegueira na sequência de operações oftalmológicas a apresentarem queixa às autoridades.

Quatro pessoas encontram-se internadas no Hospital dos Capuchos em estado grave após terem sido submetidas a operações aos olhos numa clínica privada em Lagoa (Algarve).

“O primeiro conselho que poderia dar é que sempre que exista uma situação em que uma pessoa se sinta vítima de erros de saúde deve dirigir-se às entidades competentes, como a Polícia Judiciária ou o Ministério Público e também às instituições do Ministério da Saúde”, declarou à agência Lusa Eurico Reis, juiz que presidiu à comissão de acompanhamento do processo das seis pessoas que ficaram cegas após uma operação no Hospital Santa Maria, em Lisboa.

“Muitas vezes as pessoas não se queixam. É às pessoas concretas que cabe dar o primeiro passo, não se acomodarem, apesar da situação de dor e constrangimento. Se não fizerem queixa é que nada sucederá de certeza e as pessoas que praticam atos impróprios continuarão a praticá-los impunemente”, continuou.

Para Eurico Reis, caso a clínica de Lagoa não aceite entrar num processo negocial com as vítimas, estas “podem e devem participar criminalmente”, até porque se trata de uma “ofensa corporal grave”.

As vítimas podem ainda avançar para um processo cível, de pedido de indemnização, mas só o deverão fazer depois de apurados os danos que sofreram e as suas consequências, aconselha o juiz: “Foi por isso que demorámos seis meses na comissão de acompanhamento nas vítimas de Santa Maria”.

Apesar de desconhecer pormenores do caso da clínica privada em Lagoa, Eurico Reis afirma que é uma situação bem diferente da passada no Santa Maria.

“Há uma grande diferença, já que o Santa Maria pertence ao Estado. E houve uma postura extremamente inovadora do Conselho de Administração [ao iniciar processo negocial]. Aqui trata-se de uma empresa privada”, disse.

Contudo, e sublinhando que desconhece a extensão das lesões, Eurico Reis afirmou que nos casos de cegueira a “ofensa é suficientemente grave para que o próprio Ministério Público possa desencadear por si só um processo”.

“Não faz mal nenhum se [as vítimas] fizerem queixa e muito sinceramente acho que era isso que deviam fazer. Trata-se de uma clínica que estará a funcionar fora das regras definidas por lei e isso é muito grave”, comentou ainda à Lusa.

No caso do Hospital Santa Maria, ocorrido há um ano, uma troca de medicamento na farmácia do hospital esteve na origem dos casos de cegueira, segundo o relatório da Polícia Judiciária.
Doentes que correm risco de cegueira devem participar criminalmente da Clínica de Lagoa
Na sequência disso, o Ministério Público acusou em dezembro de 2009 um farmacêutico e uma técnica de farmácia e diagnóstico como autores, na forma de dolo eventual e em concurso real, de seis crimes de ofensa à integridade física grave.

9 de Agosto de 2010 | 15:29
agência lusa

Anónimo disse...

A Inspecção--Geral da Saúde – entidade que lidera a investigação à clínica I-QMed, de Lagoa, onde quatro pessoas cegaram na sequência de operações – recebeu uma queixa há três dias. O caso remonta a Abril de 2009 e envolve uma outra clínica, tendo a vítima cegado também por uma endoftalmite. A acção da IGAS incide ainda sobre outras unidades privadas no Porto, Lisboa e Algarve. A investigação, sabe o CM, decorre com carácter de urgência para serem obtidos indícios de matéria criminal que conduzam o processo ao Ministério Público.

A IGAS continua a aguardar a chegada a Portugal do médico holandês da I--QMed, Franciscus Versteeg, para que seja ouvido no âmbito do processo.

No Hospital dos Capuchos, em Lisboa, continuam internados os quatro doentes da I--QMed. A situação de Valdelaine, de 35 anos e que perdeu a vista dos dois olhos, mantém-se inalterada, apesar de alguma instabilidade no que diz respeito às dores, revelou a amiga, Joselaine. Já Ernesto Barradas, de 83 anos, "já não sente tantas dores", contou a filha, Maria do Rosário. CM