terça-feira, 2 de dezembro de 2008

HIPOCONDRIA

“Hipocondria – assim se chama a perturbação que atinge e aflige as pessoas que vivem convencidas de que estão ou vão ficar doentes. Quase sempre adultos jovens que perante sinais e sintomas que ninguém vê faltam ao emprego, gritam aos filhos, discutem com os amigos e correm apressados para o consultório médico mais próximo. Falamos de gente que fica doente só de pensar nessa hipótese.”

Cismam que estão doentes e vivem dominados pela apreensão, a insegurança, o pessimismo e o medo. Tanto temor transparece em todas as conversas com amigos, familiares, colegas de trabalho e até com desconhecidos. A sua rubrica favorita são as doenças, as disfunções, as síndromas, os defeitos físicos, os respectivos sintomas e sinais. Um desassossego que dá maus resultados. Favorece a degradação das relações sociais, laborais e até pessoais. É assim a vida das pessoas que se crêem efectivamente doentes e que não enxergam forma de escapar à desgraça. Designam-se por hipocondríacos. Sofrem de uma perturbação da ansiedade, de um distúrbio obsessivo-compulsivo.
Os hipocondríacos fazem da sua vida um calvário. Consultam médicos atrás de médicos – vão confiar em qual? – fazem-se acompanhar por “cargas” de medicamentos e ainda assim agoniam devido ao pânico de padecerem desta ou daquela enfermidade. Mas sofrem. E amarguram o dia-a-dia dos que são mais próximos, de quem está à sua volta. E se alguém se atreve a dizer-lhes que a sua saúde é férrea, que não estão doentes, tudo se complica. Não acreditam no diagnóstico, venha ele do amigo ou do medico mais conceituado, pedem mais e mais medicamentos, mais e mais analises. Mais e mais saúde...
Não será este comportamento, só por si, doentio? De facto, os hipocondríacos estão doentes só que não sofrem das doenças que imaginam e que os afligem. “Padecem de um transtorno real, que pode tornar-se crônico, com sintomas que vão da sobrevalorização da idéia de doença à necessidade de manifestar constantemente essa preocupação, que passa pela busca indiscriminada de informação médica e pela percepção de sinais orgânicos imaginários, conforme se refere na página de internet da Associação Americana de Psiquiatria (WWW.psych.org)
O hipocondríaco é um exagerado. Doem-lhe realmente mais coisas do que à maioria das pessoas e, sendo certo que não inventaram esses sintomas, a verdade é que estão exclusivamente centrados neles. E se nos casos mais simples os doentes ficam aliviados pós uma consulta médica e aceitam facilmente que, afinal, não estão doentes; nas situações graves a vida social, familiar, laboral e pessoal do hipocondríaco complica-se pois nada nem ninguém o convence de que precisa de aprender a controlar as suas emoções. E se estes indivíduos reagem assim a doenças imaginárias, quando são confrontados com um diagnostico de doença efectivo – o que acontece com toda a gente, várias vezes ao longo da vida – desencadeiam reações desproporcionadas. Uns ficam numa profunda angustia, outros mergulham na depressão. Uns e outros isolam-se e concentram todas as forças “nessa tragédia”.

Homens e Mulheres

A fronteira entre o “normal” e o patológico nem sempre é clara e muitas pessoas podem comportar-se de um modo dito hipocondríaco a dada altura da vida sem que sofram efectivamente de qualquer doença. Isto pode acontecer e não é grave. Segundo a Associação Americana de Psiquiatria pode dizer-se, por exemplo, que um individuo sofre de uma “neurose hipocondríaca” se interpretar erradamente sinais e sintomas físicos, considerando-os sempre anormais e causadores de temores, a creditando, por isso, que sofre de uma doença grave, mesmo que os médicos lhe comprovem que está tudo bem.
Mas como se diagnostica, afinal, uma hipocondria? Em regra, pondera-se tal perturbação “quando um individuo consulta com freqüência e persistência um medico sem que tenha qualquer sinal ou sintoma de doença; quando a sua preocupação excessiva com o mal estar interfere com o desempenho das actividades quotidianas ou quando este processo se desenrola durante, pelo menos, seis meses”.
Parece que a hipocondria é um transtorno mais freqüente nos países desenvolvidos, nomeadamente entre os grupos mais escolarizados e, embora possa manifestar-se em qualquer idade, declara-se com mais freqüência nos adultos jovens. Por outro lado, este transtorno, que gera outros igualmente adversos para a saúde, como o excesso de automedicação, afecta de forma idêntica homens e mulheres e, estima-se, atinge entre cinco e dez por cento da população dos países desenvolvidos.
O hipocondríaco é um individuo que precisa de ser tranqüilizado, que necessita de acompanhamento médico, de uma resposta. Algo complexo, pois é comum não encontrar nada disto porque se recusa a confiar nas pessoas que lhe dizem está tudo bem, que não sofre de doença alguma... além da obsessão, que pode ser tratada.
Segundo a AMP, a hipocondria é uma perturbação que aprisiona um sujeito ao ponto de lhe alterar todas as vivencias, de mudar todo o seu mundo. Estes indivíduos, além do pânico das doenças, têm um medo exagerado da morte. E o mais pequeno sinal de mal-estar ou a mais leve dor de cabeça são entendidos como uma ameaça que urge afastar. Por isso, as doenças constituem o centro das suas vidas.
A doença comanda a vida... Os hipocondríacos estão constantemente preocupados com a sua saúde, centrando-se apenas nos estímulos internos (dores, palpitações, a arritmias, entre outros) que sentem, mas que passam despercebidos às outras pessoas, inclusivamente aos médicos que não os conseguem objectivar.

Não à solidão

Que factores estão na origem da hipocondria? Isso é o que muito se estuda mas que pouco se sabe. O que parece confirmar-se é que se trata de uma perturbação mais freqüente nos indivíduos que têm carências de afecto e que se sentem compensados pela atenção e a simpatia que conquistam quando dizem que... estão doentes. Também as pessoas que na infância sofreram doenças crônicas revelam aparentemente maiores probabilidades de ser confrontadas com o aparecimento de episódios de hipocondria na idade adulta. Por outro lado, há alguns factores orgânicos que precisam de ser melhor avaliados. Entre eles o limiar de sensibilidade à dor.
Para contornar ou lidar com a hipocondria, pode ser necessário fazer psicoterapia com um profissional treinado te que deixem de se sobrevalorizar as queixas e os sintomas das doenças imaginárias. Recomenda-se ainda que estes indivíduos sejam ajudados com o objectivo de perceberem que há mais vida para além das doenças, que há mais vida para além do eu, de forma que não fiquem exclusivamente centrados na sua pessoa. Propõe-se ainda que os hipocondríacos compartilhem momentos de lazer, distracção e afecto. Passar um dia só, sem falar com ninguém, é um desejo comum que lhes deve ser negado. Da prática desportiva á jardinagem, da culinária ao voluntariado, o que não falta é coisas para fazer.
Mais difícil, sobretudo com o acesso fácil e generalizado à internet, é controlar o acometimento à informação sobre doenças, uma necessidade que aparece de repente, de modo quase incontrolável. Quase, pois aqui importa esclarecer – e demonstrar – que nem tudo o que se diz e vende na rede é correcto ou faz bem. às vezes até é o contrário”.


‘Célia Rosa’

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